Por um amigo querido

Algumas vezes certas pessoas cruzam nossos caminhos, e sem querer essas pessoas acabam sendo espelhos de nós. Eu sem querer acabei topando com esse espelho, tão negro quanto eu. Sinto-me orgulhosa e feliz de conhece-lo, e agora ainda mais de poder dividir meu 'teto' com ele.
Porque as vezes amizade tratá-se sobre isso, sobre dividir coisas muito particulares com pessoas muito peculiares.
Dificil é só uma palavras que usamos para complementar um conto, um poema, não é realmente uma realidade, porque mesmo um teto distante e de dificil transposição, pode ser alcançado com as palavras certas.


Jogado no sofá, meus olhos o encaram, ele ri-me irônico, cruel, intransponível.


Frio. Brigado com minha feição, corrói-me.

Brinca comigo.

Inutilmente tento alcançá-lo.

Apenas evidencia quão alto é, quão longe estou.

Escuro. Emplaca-se como barreira invisível.

Visível. Cabalmente visível. Indubitavelmente visível.

Irriquieta-me. Algo além merece ser visto.

Recua-me. Faz perder-me a ideia capital de um sentido, esboça minha falta de capacidade.

Objetivado a concretizar meu abstrato, distancia, imóvel, meu pensamento, embora fugido, oportuno.

A massa, o concreto, fortificado. Concreto.

Pensamento concretado. A angústia de ater-se abstrato.

Iluminado. Disposto a não perder, não fugir, manter-se firme.

Sentimento algum. Ódio, talvez, fluindo, alimentado.

Razão. Perdida há muito tempo, ignora-me, adora-o.

Se pudesse, sairia, mas mantenho-me vivo por obrigação. Ele me enoja.

Minha barreira psicológica, minuciosamente criada por diversão, acanha-me, perturba-me.

Desvendo passo a passo meu inimigo.

O chiar do telefone soa a meu lado.

Intransigente, sorri-me uma ultima vez, fechado, amarelo.

Acordo de minha perturbação.

Irrelevante.

Atendo.

Chiado.

Ele.

 
Por renan,
meu querido amigo espelho.

Solidão

Estou sozinha. Não há nada a fazer sobre isso, a cada passo que dou mais sozinha eu fico. Eu não pertenço mais a lugar nenhum, não tenho um lar, não me sinto em casa, não há nada para retornar, não há onde retornar. Ao meu redor, a solidão física permeia o espaço embora eu não vá a lugar algum sem ninguém, estou sempre só.

Olho a minha volta, é frustrante perceber que estou só, enquanto todos estão rodeados e juntos. A solidão aumenta. Descobrir-se nada para o mundo é algo que causa ânsia. Estou constantemente nauseada e sinto que posso vomitar a todo instante, ou chorar, dá no mesmo. Noção de qualquer coisa que seja me escapa pelos dedos. Desaprendi a viver com pessoas porque estou vazia delas. Vejo-as o tempo todo, converso, ouço, toco, mas elas nada significam, são como luz ou vento no espaço, devem estar ali para compor o ambiente, nada mais. Qual a utilidade de qualquer uma delas em minha vida?
A indiferença preenche-me quando as vejo, ouço e sinto. Nada me causam, nada me acrescentam, continuo inutilmente igual a antes.
Sinto-me cada vez mais irrelevante ao mundo, cada vez mais inútil e desproposital. Penso e falo, olho e sinto, cheiro e ouço, sem que significado algum se faça para mim. O mundo gira, o mundo para, o mundo volta. As pessoas continuam as mesmas de sempre. Todas são as mesmas horríveis e mesquinhas de antes. Todas ainda sorriem quando me vêem passar. No fundo sei que é enrolação, posso sentir o ódio dirigido a mim, no ambiente, no meio das frases, entre os olhares. Lufadas de um ódio primitivo rondam o ambiente a minha procura. Não posso, contudo gritar-lhes para que parem, eles não o dizem.
Continuo caminhando, a cada passo mais sozinha, mais distante. É um caminho sem volta, de uma passagem só de ida, Passargada me espera ao final da linha de metro, de lá pego um trem direto até o castelo do rei, meu amigo.
A sensação de náusea não me deixa dormir, descansar, sonhar. O pensamento latejante grita-me que não presto, é insistente o bastante para manter-me sempre atenta e alerta. O cansaço vem, os dias sucedem-se, e no final nada mudou, nada nunca muda.
As pessoas ainda lutam para serem as melhores, sem se importar realmente com as outras. Todos sempre têm dentro de si um egoísmo negro e um narcisismo vermelho, que mascaram com sorrisos brancos em um mundo cor-de-rosa.
O mundo fede, as pessoas fedem, a tudo. Desde inveja inescrupulosa, ao exarcebado consumismo e o capitalismo, que não passam de desculpas para que as pessoas possam tomar o querem sem se sentirem culpadas.
Tudo ruí a nossa volta, e ninguém vê ou se importa, porque todos estão conseguindo o que querem, e os que não conseguem, mal tem força para erguer-se e dizer, e mesmo que dissessem, ninguém os entenderia ou pararia para ouvir.
O mundo é uma merda. E as pessoas são uma merda. A vida é uma merda. E ainda sim estou aqui viva, agarrada com todas as forças a uma vida que não me faz bem, a uma vida que apenas me mostra desespero e impotência.
Estou viva dentro de um mundo que temo em deixar. Temo o dia que não abrir os olhos para ver o céu cinza e as nuvens negras, o sol escaldante e as pessoas nojentas e ignorantes. Temo o dia que não poderei correr por dentre os carros fedorentos e barulhentos, entrar em uma sala mal conservada e olhar para as caras feias de pessoas desconhecidas.
Sou uma louca sem noção. Quando olho para mim, vejo que nada tenho, nada tive. A solidão que me acompanha, irá deixar-me, quem sabe, no dia de minha morte. Nasci sozinha em uma quarta-feira fria. Vivi sozinha em um mundo gelado. Escondi-me no escuro, e olhei a viva através da fechadura de uma janela.
Restam-me as letras deixadas, as entrelinhas lidas, o entendimentos dos livros, pois sou tão grande quanto as páginas dos livros que vivo, e tão real quanto as letras que escrevo.
Sou uma louca por viver.
Sou uma louca por continuar vivendo.
Sou uma louca por querer viver.
Sou uma louca.
Vivo.
Vivendo.
Só.

Meu eu

Se perguntarem por ae, diga apenas que sou uma garota que vive perdida nos trilhos, gosta de cores e notas, leva na mochila apenas um livro e uma música, deixou de ser a muito tempo alguem e busca saber quem.
Se perguntarem por ae, diga apenas que vivo, e que me viu passar, que não tenho hora pra voltar, só algo para acreditar e umas histórias para contar.
Se perguntarem por ae, diga apenas que faço jornalismo, que sonho em ver o mundo e aprendo a viver nas arestas dos amigos que levo comigo, num beco com saída pra noite.
Se perguntarem por ae, não grite os segredos, sussurre baixinho que me teve por perto, e que me viu partir sem saber pra onde, guiada apenas pela estrela polar.
Se perguntarem por ae, não tenho idade certa, acordo como uma velha, passo a tarde criança, pra crescer no almoço, viver a tarde adolescente e ir dormir alguma hora proxima da juventude, pra dançar a noite inteira, e passar todo o tempo sonhando acordada, vivendo fantasias desperta e realidades acordadas presenciadas em sonhos.
Se perguntarem por ae, não tenho ninguem para amar, nem um coração para dividir, apenas tudo o que levo comigo, e sera seu enquanto o tempo durar, sem saber se vou partir ao acordar ou ao morrer.
Se perguntarem por ae, não sigo um caminho certo, não sei da onde vim, e não faço ideia de onde chegar, pego carona na rabeira de uma moto, sigo o itinerante de um circo, acompanhando as estradas das nuvens.
Se perguntarem por ae, diga ao fim que nunca me viu, que sou apenas um sonho, uma nuvem, diga que sou um sorriso perdido nos labios de uma criança, a noite aproveitada ao lado de um alguem, um prazer, um poema, que começa intensamente e termina simplismente com : She lived and then died.